segunda-feira, setembro 10, 2007

Mais que a nega do leite

Um exercício bom para os neurônios (sob todos os aspectos: financeiros, psíquicos, fisiológicos, administrativos, emocionais, neurológicos, econômicos e até mesmo “cidadanais” de todo ser humano, ainda que não se sinta como tal, notadamente os brasileiros), é rever alguns pensamentos verbalizados de grandes pensadores – embora muitas vezes esses pensamentos não confortem, ao contrário, deixem você numa sinuca de bico.


Já aprendi que sinuca de bico provocada por esse exercício acaba por melhorar a minha capacidade de querer entender o mundo que me cerca. E, principalmente, quem habita esse mundo – mesmo com todo o desconforto que possa trazer, por expressar uma verdade que, na minha pequenez, procuro afastar, principalmente por profunda ignorância. Quando me encontro nessa situação, naturalmente, me perdôo. E ponho a culpa na minha insignificância e no meu desconhecimento, resumindo, na minha natureza humana.


Penso, mas não penso exatamente como ou do jeito que um pensamento deveria ser pensado. Afinal, não sou uma grande pensadora, sou apenas uma pensadora comum e descamisada. E, metaforando, uma pensadora do terceiro mundo. No entanto, mesmo no terceiro mundo pensamental, posso me aproximar, ainda que engatinhando dos grandes pensamentos, começando pela premissa maior: penso... logo... existo! Se bem que não raras vezes não é bem assim, e logo... desisto, buscando guarida em Alberto Caeiro: a única inocência é não pensar. É o meu caso, quando assisto à novela protagonizada por Renan Calheiros .
Outro dia me peguei pensando numa coisa totalmente maluca! Desejei ser absolutamente primitiva. Entender o mundo apenas em função do meu restrito cenário e estabelecer a relação entre o mal e o bem em decorrência exclusivamente desse cenário, ou seja, da natureza! Eu estava ali, simplesmente, como todos os outros seres inanimados ou não, aceitava o meu destino, tal como viesse, sem qualquer questionamento. O tempo, embora sentido pelas luas e sóis inexoráveis, não era medido portanto, e o sentido de finitude também passava ao largo. Já pensou que maravilha não estar pressionada cotidianamente pelo sentido de finitude?Início, meio e fim? Muito menos impunidade? Viver simplesmente? Instintivamente? Não existe o outro? Que outro?


Naturalmente, como não sou primitiva, não no sentido que os não-primitivos (como eu) conceituam, esses pensamentos foram devorados pela experiência atávica vinda de questionamentos filosóficos seculares e que induzem à consciência do sujeito, ainda que não consiga verbalizar. Ou seja, fiquei com a brocha na mão: compelida a pensar ainda que por osmose, com pensamentos que não os meus.


Garanto que busquei nos grandes pensadores alguma lógica para absorver (entender, jamais!) o que acontece no nosso Senado! Quem sabe eu poderia colocar a culpa num pensador qualquer? Aristóteles? Descartes? Ou quem sabe a coisa estava mesmo com Kant na Crítica da Razão Pura? Ou será que a buraco é mais embaixo? Talvez José Dirceu? Valério? “Jenuínos “ pensadores de como bem aplicar o nosso dinheiro?


Com toda essa trabalheira pensamental, acabei ficando exausta e embrulhada por pensamentos fugidios, ou seja, fazendo meus pensamentos falar mais que a nega do leite (expressão baiana que significa falar demais). Nesse sufoco me lembrei de Hera (que castigou Echo, roubando-lhe a inteligência e a eloqüência, condenando-a a repetir aquilo que ouvia, sem jamais ter palavras próprias) e, mais uma vez, fui tomada por um pensamento: transformar os nossos Senadores e Senadoras na próxima quarta feira em Echos, sem palavras próprias nos dedos ( no momento de votar) repetindo no voto o que viessem a ouvir da opinião pública. Dessa forma, seguindo o mesmo roteiro,o nosso presidente do Senado assumiria o papel de Narciso e, injuriado pela monotonia da opinião pública, bateria a mão naquele riozinho artificial do Planalto e, finalmente, veria o reflexo de si mesmo.

É... talvez valha a pena investir nessa idéia!



texto e trabalho gráfico: Sandra Falcone