quarta-feira, julho 18, 2007

Assim? Até eu!



Vaias sempre me incomodaram! Mais do que isso, sempre fico envergonhada - não pelos vaiados, mas pelos vaidores. Até mesmo quando se trata da loucura-sadia dos torcedores de futebol vaiando juiz, bandeirinha, torcida contrária, etc. No entanto, como diz o velho jargão, toda regra tem exceção: a vaia do Pan, na sexta-feira, na cerimônia de abertura oficial dirigida ao nosso Presidente e que acabou por impedir que ele fizesse o discurso de abertura.

Na segunda-feira, dia 16, durante o programa de radio “Café com o Presidente”, Lula disse que ficou triste, com as vaias. Nisso estamos empatados: eu também fiquei. E por dois motivos (entre muitos outros mais profundos como cidadã): o primeiro, como ser humano, condoída com a sua situação constrangedora em “tecnicolor”, diante de milhões de espectadores, microfone na mão e “papelório” do discurso engatilhado; o segundo, porque considero as vaias uma justa demonstração de desagrado e insatisfação geral de todos aqueles que têm uma mínima percepção do que ocorre no nosso cotidiano.

Quem representa direta ou indiretamente o “estado” brasileiro? Mal comparando: quando uma empresa vai mal das pernas os acionistas cobram resultados dos funcionários ou dos diretores que a administram? Devo pontuar que o único aspecto que, de alguma forma, foi gratificante nesse episódio, está no fato do Presidente admitir que estava triste, tocando na ferida, diferentemente de seus partidários que procuram desculpas esfarrapadas para justificar as vaias recebidas, ou, ainda, a cara-de-pau da sua assessoria de imprensa: houve apenas uma confusão entre os cerimoniais do presidente e do Pan. Tábom, sei…
Ele tem que ficar triste sim! Não com os vaidores, mas com as causas que determinaram as vaias, compreendê-las e analisá-las como faria se ainda fosse um simples mortal brasileiro.
Quanto às suspeitas do ministro do Esporte, Orlando Silva Jr., segundo notícia veiculada na UOL, de que a vaia foi “armada” e que seria uma orquestração que ele pretende “averiguar”, seria interessante que o ministro gastasse seu tempo em outras averiguações mais fundamentais para o Brasil e para o povo brasileiro e que continuam no limbo. Aliás, eu nunca vaiei ninguém mas, como já disse, toda a regra tem exceção e, portanto, estou vaiando o ministro quando clona o Nelson Rodrigues para desmerecer o sentimento que levou os brasileiros às vaias: "Foi uma minoria que estava no estádio. No Brasil, vaia-se até minuto de silêncio, como diria Nelson Rodrigues”.Se eu fosse o nosso Nelson Rodrigues dava um jeito de puxar as orelhas do ministro pela infeliz declaração. Meu caro ministro, que papelão!
Lamento a decisão do Presidente de não voltar ao Pan, afirmando que a festa não era sua. Esperava que ele fosse suficientemente forte para enfrentar a platéia (que o elegeu) de peito aberto, olho no olho, tendo consciência de que todo foco de tensão emite sinais, dói ou incomoda, de um modo ou de outro, no pressuposto de que alguém com a envergadura e magnitude do seu cargo, representando milhões de almas brasileiras, necessariamente tem que superar esse tipo de “dodói” e “bico”, não só nas palavras mas, fundamentalmente, nas atitudes.
Existe um erro de perspectiva do nosso Presidente quando, magoado, diz que fui preparado para uma festa, como se fosse convidado para o aniversário de um amigo e, quando chegasse, encontrasse um grupo de pessoas que não queria minha presença lá. A festa foi ele quem preparou, era o anfitrião. Portanto, como tal deveria ter se comportado, ainda que sob mais cem vaias além das seis com que foi agraciado.
Espero que todo esse pano de fundo do Pan (mesmo que por estradas vicinais e uma conta que tenho certeza vou ter que amargar como cidadã ) resulte numa conscientização e vontade política de nossos representantes relativamente aos nossos atletas que nos dão tanto, por tão pouco que recebem e que possam ter a tranqüilidade necessária para se dedicarem ao exercício de suas habilidades, com instalações dignas, apoio logístico e o reconhecimento que merecem de todos nós.
Finalmente, não posso deixar de constatar que, infelizmente, a imagem “externa” é muito mais valorizada do que a imagem “interna”, ou seja, o batom antes da boca (desdentada ) traduzida nas reiteradas “ batidas no peito” do governo, em todos os níveis que atuaram no Pan, no que diz respeito à organização “impecável” desse acontecimento esportivo ! Será que é preciso dizer que a organização do Pan está vinculada aos investimentos mastodonticos que foram feitos? Grana grossa e, fundamentalmente, VONTADE POLÍTICA?
Assim? Até eu!
texto: Sandra Falcone