quinta-feira, maio 17, 2007

Farfarella


Era um pastor de ovelhas profundamente solitário. Não tinha família... ninguém. Seu único bem, uma flauta, uma velha flauta que tinha achado e que aprendera a tocar sozinho.
Nos fins de tarde, quando as ovelhas dormitavam e a Colina preparava-se para receber a Noite, entoava na flauta a sua solidão em doces e melancólicas melodias. Eram momentos mágicos. A Colina ficava silenciosa e atenta. Até mesmo um bando de frágeis borboletas ficava zanzando até que a Brisa avisava que a Noite já abraçava a Tarde. E elas corriam para o seu refúgio, com medo do senhor Frio, que era implacável.Tantas foram as Tardes que uma Borboletinha minúscula, branquinha, quase invisível, apaixonou-se perdidamente pelo Pastorzinho. Temerosa e tímida, misturava-se nas flores do campo, ouvindo, apaixonada, suas canções.
Uma tarde a Borboletinha, quando alcançou a Colina, não escutou a flauta do seu amor . Preocupada, aproximou-se bem de mansinho. O seu ínfimo coração doeu brutalmente quando viu que seu amado dormia abraçado por uma tristeza tão grande que o Céu compadecido chorava. Todo o imenso amor que sentia explodiu, arrebatando-a. Não resistindo, beijou e acariciou o seu amado, com uma ternura e um amor tão infinito, que o Infinito tornou-se insignificante.
Na manhã seguinte, o Pastorzinho despertou com uma sensação indescritível. Sabia que tinha sonhado um sonho lindo, mas foi incapaz de lembrar. Ficou dias e dias assim, querendo lembrar do sonho e nessa busca desesperou-se. Não tocava mais sua flauta. Abandonou as ovelhas à própria sorte e esqueceu de dormir.Todos os habitantes da Colina perguntavam, queriam ajudar, mas o Pastorzinho não ouvia ninguém, não queria contar o seu segredo. Estava cada dia mais triste, e a Colina acabou se entristecendo também. As flores foram murchando, os pássaros não cantavam mais , o Carvalho cada vez mais curvado.
Numa tarde, muito tempo depois, fraco, sem nenhuma resistência, fechou os olhos e lamentando a sua sorte acabou adormecendo. A Borboletinha apaixonada aproveitou e foi até o seu amado, tentando reanimá-lo. Ficou tanto tempo ali que não percebeu que a Noite já havia chegado e com ela o senhor Frio. Trêmula de emoção, entendendo que não tinha a menor condição de resistir, acatando o seu destino, despediu-se da vida e, com toda a ternura e amor do seu coraçãozinho já muito fraquinho, pousou o seu último alento nos lábios do seu amado. Ao leve roçar da Borboletinha, mesmo dormindo, o Pastorzinho entreabriu os lábios e um sorriso que estava há muito tempo escondido aproveitou a boca semi-aberta e fugiu daquela tristeza intermitente.
No dia seguinte, o Pastorzinho despertou cheio de vida. O cansaço havia desaparecido completamente. Cuidou das suas ovelhas, tocou a sua flauta, com aquele sorriso fujão pregado nos lábios, falando e cantando aos quatro Ventos, contagiando toda a Colina. As Sementinhas saíram dos buracos, transformando-se em flores silvestres cheirosas, os pássaros voavam alegres, a brisa dançava pela relva, um Arco-Íris chegou todo colorido, enquanto Nuvenzinhas sapecas brincavam de pega-pega no Céu.
Se você quiser encontrar o Pastorzinho vá até a Colina. Tenho certeza que vão ser bons amigos.Ele gosta muito de conversar, é muito alegre! Mas se chegar à noitinha, não faça barulho. Ele gosta de dormir. Quando dorme sonha com uma Fada. Quando acorda não lembra do sonho, mas perdeu a mania de querer lembrar. Entendeu que o seu sonho não precisa ser lembrado, apenas sentido no fundo do coração.
Gosta de todos os habitantes da Colina, mas tem uma preferência pelas borboletas, especialmente as pequeninas, frágeis e branquinhas. Nunca entendeu o porquê!
Sandra Falcone

Melissa



entre a aurora e o poente
desabrochou Melissa
adivinha na luz difusa
um novo mundo

se aninha docemente
nos braços da mãe
e chora
comovida
agradecendo a vida



com meu carinho
em 30 de abril de 2007

Sandra Falcone